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O desafio do magistério no Brasil: atualizar o processo de aprendizagem para o século XXI

Na próxima década, mais de 60% dos professores em atividade no Brasil poderão se aposentar. A mudança demográfica que está em curso no país demanda uma nova forma de pensar a carreira na educação.

Por Claudio Sassaki

Na próxima década, mais de 60% dos professores em atividade no Brasil poderão se aposentar. A mudança demográfica que está em curso no país demanda uma nova forma de pensar a carreira na educação. A análise Como melhorar a educação? – conduzida pelo Instituto Alfa e Beto – aponta que o desafio do magistério no Brasil não reside unicamente no currículo dos cursos de formação ou nos salários; o impasse está em como criar novas e atraentes carreiras para os jovens recém-formados, o que inclui mecanismos para que esse profissional tenha acesso a diferentes maneiras de continuar aprendendo. E aprender é uma demanda clara entre os professores, sobretudo os mais jovens.

Com mais de 2,2 milhões de docentes no país, a percepção é que a valorização do profissional da educação está em um conjunto de estratégias cujo ponto central é o apoio à formação continuada. A pesquisa Profissão Professor – liderada pelo movimento Todos pela Educação com mais de 2 mil professores brasileiros de educação básica e ensino médio, em junho de 2018 –, apontou que 69% dos educadores defendem que dar mais oportunidades de qualificação aos docentes que estão na ativa é a medida mais eficaz para a valorização da profissão pela sociedade. Apesar de haver outras questões importantes como a valorização salarial do professor, é relevante saber que ele quer ser visto como um profissional inovador e bem-preparado.

Quando pensamos em como tornar a profissão atraente para os jovens brasileiros, podemos buscar inspiração em países com reconhecida qualidade na educação. Em algumas nações, os jovens primeiro se formam em um curso superior e, posteriormente, são cooptados para o magistério; para isso, recebem treinamento específico para ingressar na atividade. Na prática, existe a criação de novas carreiras dentro do magistério e uma busca ativa por profissionais com o perfil mais adequado. A partir dessa escolha, desenvolve-se formas diferentes de treinar esses futuros professores para a função. No Chile, há 20 anos a carreira é pensada de maneira coordenada: desde a atração de jovens profissionais ao desenho da carreira; eles empreendem, inclusive, políticas para atrair os alunos do ensino médio – com melhor desempenho – para a profissão.

O Mapa da Aprendizagem – iniciativa da IEDE, Fundação Lemann e Itaú BBA, cuja proposta é fomentar um debate qualificado sobre a atratividade da carreira de docente no Brasil – aponta que o cenário para atrair jovens para a profissão é desafiador. Em cinco áreas avaliadas pela plataforma que compara as médias de aprendizagem dos estudantes no PISA 2015 (por nível socioeconômico, sexo e carreira pretendida, aos 30 anos, sobretudo o projeto de seguir o magistério ou não), os alunos brasileiros que manifestam a intenção de serem professores têm desempenho inferior aos que querem seguir outras carreiras. Enquanto 14,5% dos estudantes que querem seguir outras profissões têm desempenho adequado em Matemática, os que seguirão a docência apresentam índice de 6,8%. Nos países que se destacam pelos sistemas de ensino, a situação é diferente: no Japão, por exemplo, 85% dos alunos que esperam seguir a carreira docente têm desempenho adequado em matemática, contra 80,7% dos que esperam seguir outras profissões. Os dados não revelam, no entanto, as áreas mais procuradas por esses jovens – uma informação relevante quando avaliamos o desempenho no PISA para os pretendentes de carreira docente em humanas ou exatas, por exemplo. Na prática, o país demanda dados mais aprofundados para termos um repertório mais acurado; precisamos saber, por exemplo, os motivos desse péssimo desempenho em Matemática e qual seria esse valor em Língua Portuguesa.

Não tenho dúvida que o professor é a peça-chave para a melhoria da qualidade da educação em qualquer país. Jonah Rockoff, John Friedmane e Raj Chetty, professores da Universidade de Harvard, empreenderam uma pesquisa sobre educação, mobilidade social e desigualdade para investigar qual seria o mecanismo para que crianças vulneráveis possam ter melhores perspectivas na vida adulta. O estudo mostrou que alunos expostos a bons professores na infância e na adolescência, tiveram um aumento na chance de cursar boas universidades; de terem melhores salários. Os bons professores também diminuíram o risco de gravidezes indesejadas na adolescência; e de os alunos, no futuro, viverem em locais violentos. Bons professores têm impacto positivo sobre o capital humano na vida adulta e no bem-estar social. Para isso, atrair jovens profissionais talentosos é essencial, além de apoiá-los no desenvolvimento contínuo – a chamada lifelong learning.

Convidado a palestrar em um evento de inovação, eu ouvi um desabafo de uma professora – que lá estava, buscando conhecimento. Segundo ela, valorizar o professor passa por descrever esse profissional, sobretudo na mídia, com dignidade. Para essa professora, só há espaço para reportagens, mostrando o docente superando todas as más expectativas para avançar no ensino. Ou seja, o professor super-herói. Falta espaço para mostrar o docente que cotidianamente investe na própria evolução profissional; que busca formas de tornar a profissão inspiradora e atraente para novas gerações.

Acredito que as escolas precisam rever os modelos de aprendizagem. Ao tornar a aprendizagem mais atraente para estudantes, também criamos a oportunidade de fazer o mesmo com a profissão do professor. Na medida que os estudantes de hoje vêem a possibilidade de pensar o processo de aprendizagem à luz das inovações tecnológicas, essa carreira ganha novas cores e desafios. Se o modelo tradicional não traz o engajamento do estudante no processo de aprendizagem, como ele vai engajar a escolha pela docência? Essa é uma questão que devemos responder.

Existe uma visão convencional de que o bom professor é aquele que transmite todo o conteúdo, entretanto, o que os jovens de hoje precisam não é a garantia de que a matéria foi dada; antes, trata-se da garantia de que esse aluno aprendeu; assimilou o conteúdo. Para além, temos que assegurar que os estudantes desenvolvam as habilidades importantes para que tenham oportunidade de escolha na vida futura, ou seja, possam escolher profissões que nem sabemos quais serão. Isso demanda um novo modelo de aprendizagem: saímos de um formato onde o foco do professor sai de mero "transmissor do conteúdo" para o que garante que o aluno vai aprender. É urgente fazermos essa distinção, pois se a escola conseguir valorizar esse profissional abrirá espaço para que esse docente incorpore a rotina de estudar continuamente; ele vai ter que se adaptar a uma sala de aula muito diferente da que frequentou quando era aluno. Ao conduzir essa mudança, a escola dará o estímulo necessário para o professor abraçar o lifelong learning.

Hoje, há algumas funções na educação – e na profissão do professor – que são pouco divulgadas: a de designer pedagógico, por exemplo. Pensar nas experiências de aprendizagem da mesma forma que um designer estrutura soluções é uma forma interessante de enxergar que o professor não se limita a "reproduzir conteúdos"; o docente de hoje precisa ir além: tem que usar a tecnologia disponível para otimizar tempo e desempenho; com isso, ter mais espaço para desenhar estratégias e experiências de aprendizagem que realmente façam sentido para a vida dos estudantes. Em suma, o papel do professor é desenhar a melhor experiência para que um determinado grupo de alunos consigam aprender o que precisam. Pessoalmente, acho isso inspirador, pois traz uma nova dimensão para esse professor do século XXI.

Como mestre em Educação e com a experiência que adquiri em oito anos de atuação da Geekie – mais de 12 milhões de alunos e tendo convivido com milhares de professores –, entendo que para melhorar a educação no Brasil, temos que apoiar os docentes e inspirar nossos jovens estudantes a pensar no magistério como uma alternativa de carreira.

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Autor: Claudio Sassaki é mestre em Educação pela Stanford University e cofundador da Geekie, empresa referência em educação com apoio de inovação no Brasil e no mundo.
Fonte e Imagem: Frida Luna Comunicação
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